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Treinta y dos

por Joanna, em 06.02.16

Os meus ouvidos zumbiam enquanto o meu coração batia descompassadamente no meu peito. Atirei-me contra a porta de casa tentando impedir a entrada do Theo na mesma mas não fui rápida o suficiente nem tinha força suficiente para contrariar o empurrão que ele fazia do outro lado.

O meu corpo foi empurrado para trás assim que a porta se abriu e só tive tempo para correr em direção à sala onde sabia que tinha algumas, mas poucas, probabilidades de conseguir chegar ao sofá onde se encontrava o meu telemóvel. Não consegui chegar ao meu destino antes de sentir os braços do Theo à minha volta e estar completamente colada ao seu corpo.

- Já devias saber que eu vinha à tua procura. – murmurou ele contra os meus cabelos – Porque é que não esperaste por mim? – encolhi-me contra o seu aperto e mordi o meu lábio inferior com força para tentar conter as lágrimas – Aquele Enzo… - murmurou ele irritado ao mesmo tempo que fazia mais força no meu braço.

Abanei a cabeça com força e endireitei-me de forma a conseguir olhá-lo nos olhos – Estava à tua espera. – murmurei com um pequeno sorriso – Fiquei com medo que não viesses e por isso é que me aproximei dele mas devia saber que tu não ias desistir de mim. – o meu coração continuava a martelar contra o meu peito mas tentei acalmar os meus pensamentos assim que o aperto do Theo afrouxou ligeiramente – Sabes que só te amo a ti.

- Tive tantas saudades tuas. – fechei os olhos com força assim que os braços do Theo voltaram a rodear a minha cintura, puxando-me completamente para si para depois passar as mãos por todo o meu corpo – Tantas saudades…

Os lábios do Theo estavam agora no meu pescoço enquanto as suas mãos passavam por dentro da minha camisola; o zumbido tinha voltado a instalar-se nos meus ouvidos enquanto eu tentava focar os meus pensamentos e foi nesse momento que vi a jarra azul pousada no móvel bastante perto de mim.

O Theo continuava demasiado focado no meu corpo para se dar conta que um dos meus braços já não estava à volta dele e foi graças a isso que consegui chegar à jarra e atirar a mesma contra a cabeça dele. As suas sobrancelhas juntaram-se numa expressão confusa antes de ele cair no chão ao lado de todos os cacos de vidro e a única coisa que tive tempo foi de agarrar no meu telemóvel, marcar o código de segurança por duas vezes já que os meus dedos tremiam como varas verdes, e ir até aos contactos para ligar à Meg. Estava prestes a carregar na tecla verde quando gritei de dor ao sentir os meus cabelos serem puxados para trás.

- Sua cabra mentirosa! Fiz tudo por ti! Só te amei a ti e tu fazes-me isto?! Vais ser minha de uma maneira ou de outra!

Foram as últimas palavras que ouvi antes de ficar tudo preto.

**

A primeira coisa que senti foi uma dor horrível no pescoço e a segunda foi que tinha os pulsos presos atrás das minhas costas. Abri os olhos lentamente e tive de os piscar algumas vezes até conseguir focar a visão. Ainda estava na casa que tinha pertencido aos meus pais o que queria dizer que não podia ter estado inconsciente durante muito tempo, caso contrário o Theo já me tinha levado para outro sítio qualquer. Por falar em Theo, não o via em lado nenhum mas conseguia ouvir a voz dele a assobiar uma canção qualquer ao longe. Cozinha, parecia vinda da cozinha.

Tentei soltar os pulsos mas a única coisa que conseguia era que a corda fizesse mais força na minha pele e me magoasse ainda mais por isso desisti e em vez disso tentei procurar alguma coisa que desse para cortar a corda. Com os pedaços de vidro da jarra que estavam a uns metros de mim. Se conseguisse puxar para mim um com as pernas…

O meu olhar parou na entrada da sala quando o vi. Senti-me inundar por uma onda de alívio por o Enzo estar ali mas ao mesmo tempo comecei a sentir a preocupação do que aconteceria caso o resto do grupo também estivesse a chegar e o que é que o Theo poderia fazer.

- Onde é que estão os outros? Eles não podem-

- Os outros estão bem. – foi a resposta do Enzo enquanto me soltava as mãos – Ainda estão no supermercado.

Levantei-me e olhei para ele, mantendo o meu tom de voz tão baixo quando possível – Temos de sair daqui, temos de chamar a polícia, ele está aqui. – murmurei agarrando na mão do Enzo para o puxar dali para fora mas em vez de vir comigo, ele não se mexeu e ainda a agarrar na minha mãe com força, também não me deixou sair dali – O que é que estás a fazer? – perguntei quando senti o pânico voltar a instalar-se em todas as células do meu corpo.

- Não vamos sair daqui. – foi a única coisa que disse antes de me apontar uma arma.

- O que é que estás a fazer? – repeti a pergunta agora totalmente assolada pelo pânico – Enzo? – as lágrimas desciam-me pelas bochechas sem que eu as conseguisse controlar – Estás com ele? Estiveste este tempo todo com ele? – assim que coloquei os meus medos em voz alta senti um aperto no peito, como se alguém me estivesse a arrancar o coração. Tinha confiado no Enzo, estava apaixonada por ele e tinha sido tudo uma enorme mentira – Vais matar-me? – atirei-me contra o peito dele e comecei a socar o mesmo – Ou vais ajuda-lo a levar-me para outra cave? Confiei em ti! – neste momento já não estava a sussurrar, estava bastante próxima dos gritos e apesar do Theo estar noutra divisão, não quis saber; eles estavam juntos, tinham estado sempre juntos.

- Sky cala-te!

- Sky?

O Theo apareceu na sala novamente e enquanto eu tentava procurar por possíveis locais de fuga apesar de saber que nunca conseguia fugir aos dois, descontrolou-se tudo. Em vez de se juntarem para me prender novamente ou algo do género, o Theo lançou-se contra o Enzo que conseguiu aparar o golpe de forma a não se magoar mas ainda assim perdeu o equilíbrio e caiu para trás, fazendo com que a arma fosse atirada para longe. Fiquei alguns segundos a olhar para aquele emaranhado de corpos, com os meus pensamentos também demasiado emaranhados para eu conseguir perceber o que se estava a passar ou o que fazer.

Quando consegui finalmente pensar em alguma coisa, corri até ao sofá para agarrar no meu telemóvel e fugir dali para fora o mais depressa possível. O Theo, graças ao facto de se encontrar em cima do Enzo, viu-me e por isso começou a caminhar na minha direção quando o Enzo lhe agarrou na perna e o fez cair novamente no chão.

O Enzo estava agora em cima do Theo a dar golpes atrás de golpes e só quando levantou o olhar na minha direção é que consegui ver que também ele estava com o rosto todo ensanguentado.

- Sky saí daqui!

E era mesmo isso que eu ia fazer quando fui parada à entrada de casa pelo Santiago. Encolhi-me ao ir contra ele e pela primeira vez desde que o conhecia, senti medo dele assim que as suas mãos se prenderam com força nos meus braços.

- Onde é que está o Enzo? – não conseguia dizer nada; abri a boca para falar mas não conseguia dizer nada e o aperto do Santiago apenas se tornou mais forte – Saí daqui. – fui empurrada para o lado para depois ver o Santiago a afastar-se de mim em direção à sala.

Estava a sair apressadamente de casa com o telemóvel na mão para marcar o número do meu pai quando o ouvi. A rua encontrava-se em total silêncio e apesar de parecer que os meus pensamentos gritavam dentro do meu crânio, o barulho do tiro abafou por completo qualquer som.

Estaquei imediatamente, sentindo as pernas demasiado fracas para me mexer ou até mesmo para aguentar em pé e foi por isso que me tive de agarrar à soleira da porta. Depois do que pareceu uma eternidade, consegui manter-me novamente em pé e com o telemóvel esquecido no chão do alpendre, voltei para dentro de casa, caminhando lenta e nervosamente até à sala.

A primeira coisa que vi foi o chão coberto de sangue. Aos poucos o meu olhar foi-se aproximando do local de origem de todo aquele vermelho e senti novamente a força das pernas a falhar ao ver o corpo imóvel no chão da sala.

- Porque é que fizeste isso?

- A culpa foi toda minha, não tens de levar com os meus pecados.

- Deixa-te de merdas! Estamos lixados, estamos todos lixados!

Cai de joelhos no chão, já sei aguentar todo o peso do meu corpo e assim que a minha pele entrou em contacto com todo aquele sangue quente, encolhi-me contra a parede. O Theo estava morto. O Theo já não me podia magoar. Mas ainda assim não me sentia minimamente aliviada.

- Sky? – levantei o olhar para a cara do Enzo quando ele se aproximou de mim e desviei por segundos o olhar para o Santiago que continuava no mesmo sítio, com a arma na mão. Voltei a minha atenção para o Enzo sem perceber nada do que se tinha passado e ainda demasiado em choque para qualquer reação – Está tudo bem. Ele já não te pode fazer mal.

- O que é que vocês fizeram? – murmurei tão baixo que nem tinha a certeza se ele tinha ouvido.

Saltei ao ouvir aquele baque surdo no chão – Acabámos de te salvar a vida, de nada. – ironizou o Santiago enquanto passava as mãos pelos cabelos – Qual é o plano agora?

- Tu ias matá-lo? – voltei a olhar para o Enzo e assim que ele esticou a mão na minha direção, encolhi-me ainda mais contra a parede – O plano sempre foi matá-lo? Tu sabias que ele estava aqui? Tu sabias que ele vinha atrás de mim. Oh meu deus, Enzo. Temos de chamar a polícia.

- Não vamos chamar polícia nenhuma, eu trato disto.

- Como é que vais tratar disto?! – gritei – Temos uma pessoa morta na sala! Como é que se trata disso?

- Eu-

- Chegámos! – gritou a Lola da entrada e sendo a que vinha a frente, foi a primeira a aparecer na sala – Oh meu deus. – a expressão divertida e alegre desapareceu assim que o seu olhar parou no corpo imóvel do Theo – O que é que se passou?

- O que é que se passa? – a voz seguinte foi a da Meg e assim que entrou na sala também a sua expressão se alterou completamente – Sky? – só quando senti as mãos dela nos meus joelhos é que percebi que tinha estado a balançar-me para a frente e para trás, ainda contra a parede e agora ainda mais coberta de sangue do que antes – O que é que aconteceu?

- Ele está morto. – murmurei – Ele está morto. – era a única coisa que conseguia dizer.

- Mas que merda é que vamos fazer agora? – era a voz do Diego.

- Foi auto defesa certo? – a Lola tentava soar esperançosa – Temos de chamar a polícia e contar-lhes o que aconteceu.

- Não vamos chamar polícia nenhuma, o Enzo sabe o que temos de fazer.

- Onde é que está o Enzo? Tiago…

Não consegui ouvir mais nada da discussão assim que depois de a Meg me ajudar a levantar, me levou até à pequena casa de banho. Sentei-me dentro da banheira, completamente vestida e mantive-me tão imóvel e calada como antes enquanto a minha prima ligava a água e tentava aquecer a mesma.

- Sky…

- Ele está morto. O Theo está morto.

- Eu sei. – olhei para a Meg que me olhava com uma expressão sofrida – Eu sei e vai tudo ficar bem.

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publicado às 18:55